Quando descobri que tinha trombofilia durante minha gestação, a primeira pergunta que fiz foi: “Doutora, vou conseguir ter parto normal?” Se você está passando pela mesma situação, quero te tranquilizar: sim, é possível ter parto normal com trombofilia. Como obstetra especializada em gestações de alto risco, vou explicar tudo que você precisa saber sobre essa condição.
O que é Trombofilia e Por Que Ela Preocupa na Gestação?
A trombofilia é uma condição em que seu sangue tem maior tendência a formar coágulos (trombos). Imagine que seu sangue fica um pouquinho mais “grossinho” do que deveria, aumentando o risco de entupir os vasos sanguíneos.
Durante a gravidez, nosso corpo naturalmente já tem uma tendência maior à coagulação – é uma proteção natural para evitar sangramentos excessivos no parto. Mas quando você tem trombofilia, essa tendência fica ainda mais acentuada, e é por isso que precisamos de cuidados especiais.
Existem dois tipos principais: a trombofilia hereditária (que você nasce com ela) e a trombofilia adquirida (que desenvolve ao longo da vida). Independente do tipo, o importante é saber que com o acompanhamento correto, você pode ter uma gestação tranquila.
Por Que Muitas Pessoas Acham que Trombofilia Impede o Parto Normal?
Essa é uma dúvida muito comum no meu consultório. Muitas pacientes chegam até mim achando que vão precisar fazer cesárea obrigatoriamente. Isso acontece porque existe um mito de que gestantes com trombofilia não podem ter parto vaginal.
A verdade é que a trombofilia, por si só, não é uma contraindicação para o parto normal. O que precisamos avaliar são outros fatores, como o uso de medicações anticoagulantes e as condições específicas de cada gestação.
Como Funciona o Tratamento da Trombofilia na Gravidez?
Durante a gestação com trombofilia, geralmente utilizamos um medicamento chamado heparina de baixo peso molecular. É uma injeção subcutânea (aquela picadinha na barriga) que você toma diariamente para manter seu sangue na consistência ideal.
Sei que pode parecer assustador no início, mas a maioria das minhas pacientes se adapta rapidamente. A heparina é segura tanto para você quanto para o bebê, não atravessa a placenta e não causa malformações.
O grande segredo está no timing: precisamos saber exatamente quando parar a medicação antes do parto para que você possa ter um trabalho de parto seguro, seja ele normal ou cesárea.
Parto Normal com Trombofilia: Como Planejamos?
Quando uma paciente com trombofilia quer ter parto normal, fazemos um planejamento cuidadoso. Primeiro, avaliamos qual tipo de trombofilia ela tem e se está usando anticoagulantes.
Se o parto for programado (como uma indução), conseguimos programar a parada da heparina com 12 a 24 horas de antecedência. Mas se o trabalho de parto começar espontaneamente, avaliamos caso a caso. Na maioria das vezes, conseguimos conduzir o parto normal normalmente.
Vantagens do Parto Normal para Quem Tem Trombofilia
Acredite ou não, o parto vaginal pode até ser mais vantajoso para gestantes com trombofilia:
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- Recuperação mais rápida significa menos tempo de imobilização
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- Menor risco de infecções
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- Sangramento geralmente menor que na cesárea
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- Retorno mais rápido às atividades normais
Quando a Cesárea é Realmente Necessária?
Existem algumas situações específicas em que recomendamos a cesárea em gestantes com trombofilia:
Quando a paciente está usando doses altas de anticoagulantes muito próximo ao parto, quando há outras complicações obstétricas associadas, ou quando existe um histórico de eventos trombóticos muito graves. Mas essas são exceções, não a regra.
Cuidados Especiais Durante o Parto
Durante o parto de gestantes com trombofilia, temos alguns cuidados especiais. Evitamos procedimentos desnecessários, como episiotomias de rotina, e ficamos atentos ao timing para anestesias regionais (raquianestesia ou peridural).
A boa notícia é que, na maioria dos casos, conseguimos oferecer alívio da dor normalmente. Só precisamos respeitar um intervalo de tempo após a última dose de heparina.
O Pós-Parto: Período Crítico
O puerpério (período após o parto) é quando precisamos ter mais atenção. É nessa fase que o risco de trombose é maior, independente do tipo de parto que você teve.
Geralmente, retomamos a heparina entre 6 a 12 horas após o parto, dependendo de como foi o sangramento. Também orientamos mobilização precoce – nada de ficar muito tempo parada na cama.
Esse cuidado se estende por 6 a 12 semanas após o parto, período em que seu corpo está voltando ao normal.
Sinais de Alerta que Você Deve Conhecer
Durante toda a gestação e principalmente no pós-parto, é importante ficar atenta a alguns sinais:
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- Dor e inchaço em uma das pernas
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- Falta de ar súbita
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- Dor no peito
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- Tosse com sangue
Se qualquer um desses sintomas aparecer, procure atendimento médico imediatamente.
A Importância da Equipe Multidisciplinar
O tratamento da trombofilia na gestação não é trabalho de uma pessoa só. Trabalho sempre em conjunto com hematologistas, anestesistas e toda a equipe de enfermagem. Cada profissional tem seu papel fundamental para garantir sua segurança.
Planejando Futuras Gestações
Se você tem trombofilia e está pensando em ter mais filhos, o planejamento pré-concepcional é fundamental. Podemos otimizar seu tratamento, avaliar se há necessidade de investigações adicionais e te preparar para uma nova gestação ainda mais tranquila.
Minha Experiência Como Obstetra
Em mais de 15 anos acompanhando gestantes com trombofilia, posso afirmar que a grande maioria consegue ter partos normais quando esse é seu desejo. O segredo está no acompanhamento adequado e no planejamento cuidadoso.
Lembro de uma paciente que chegou ao meu consultório aos prantos, achando que nunca poderia ter o parto dos seus sonhos por causa da trombofilia. Hoje, ela já teve dois filhos de parto normal e sempre me manda fotos das crianças.
Dicas Práticas para o Dia a Dia
Se você tem trombofilia e está grávida, algumas dicas podem ajudar:
Mantenha-se ativa conforme orientação médica – caminhadas leves são excelentes. Use meias de compressão se recomendadas. Beba bastante água para manter uma boa hidratação. E principalmente, não falte às consultas de pré-natal.
Conclusão: Trombofilia Não Define Seu Tipo de Parto
Quero que você saia daqui sabendo que trombofilia e parto normal podem sim andar juntos. Sua condição não define automaticamente que você precisará de uma cesárea. Com o acompanhamento adequado e uma equipe experiente, você pode ter o parto que deseja.
O mais importante é ter confiança na sua equipe médica e seguir todas as orientações. Cada gestação é única, e seu caso será avaliado individualmente, sempre priorizando a segurança sua e do seu bebê.
Se você tem trombofilia e está grávida, não deixe que o medo tome conta. Procure um obstetra especializado em gestações de alto risco e tire todas as suas dúvidas. Você merece ter uma gestação tranquila e o parto que deseja.
Com carinho,
Dra. Aline Diniz – CRM 18728 | RQE 12945
Obstetra especializada em gestações de alto risco
Goiânia/GO